10 de julho de 2012

‘‘Coleção Fritz Lang em Hollywood - Volume 2”


‘‘Coleção Fritz Lang em Hollywood - Volume 2
Nova caixa traz três filmes que oferecem tensão e desejo com a peculiar maestria do cineasta.
C&N
Nos vários anos em que trabalhou no cinema norte-americano, Fritz Lang (1890-1976) precisou se sujeitar a fazer filmes de encomenda. Apesar do grande prestígio consolidado na fase do expressionismo alemão, ele não podia se dar ao luxo de ser um autor, de expor totalmente a sua visão de mundo. Os tempos eram outros, Hollywood tinha um rígido sistema industrial para atender a imensa demanda por suas produções. Mas, mesmo sob restrições, o cineasta se saiu bem, conforme se viu no primeiro volume desta coleção, também lançado pela Versátil, em 2012, e agora, neste que traz mais três dos longas feitos nos Estados Unidos a partir de 1936.
Realizados em preto e branco, entre 1954 e 1956, estes contam histórias que possibilitam tensão a partir de crimes e, também, a força predatória da luxúria.
Desejo Humano” (“Human Desire”, 1954) é aquele que mais explora os percalços da libido. Mas faz isso limitado pela forte censura que existia em Hollywood. Enfoca um romance adúltero, que nasce entre Jeff Warren (Glenn Ford) e Vicki Bucley (Gloria Grahame), esposa de Carl Buckley (Broderick Crawford), funcionário da estrada de ferro onde o primeiro é maquinista. Rude e alcoólatra, Carl está na iminência da demissão. Para evitá-la, resolve usar a mulher que, em outros tempos, namorou o chefão John Owens (Grandon Rhodes). Ao descobrir que a garantia do emprego passou por uma relação carnal entre Vicki e John, o marido decide assassinar o magnata, armando uma armadilha no trem em que os três viajam. Mas o plano corre perigo devido à presença de Jeff como passageiro. E ele é conhecido dos Buckley. Em vez de, após o crime, enveredar pela trilha policial, o protagonista sucumbe à atração exercida por Vicki. Esse é o principal charme do longa, terceira das cinco ou seis versões do romance “A Besta Humana”, de Emile Zola (1840-1902); a segunda (a primeira sonora), também famosa, foi feita por Jean Renoir em 1936. Como no filme do consagrado cineasta francês, Lang também explora com habilidade os trilhos dos trens e os movimentos destes. Mas o melhor é o aproveitamento que ele deu à volúpia algo vulgar que Gloria Grahame transmite com perfeição, como havia feito no filme anterior do diretor, “Os Corruptos”, onde também contracenou com Glenn Ford.  Quando perguntei a Lang sobre a atriz, ele respondeu com apenas duas palavras pejorativas e, seco, mandou prosseguir a entrevista com melhores questões. Obedeci. Soube, posteriormente, que ela não era pessoa fácil. Vencedora do Oscar de melhor coadjuvante de 1952, por “Assim Estava Escrito”, foi casada com Nicholas Ray (o diretor de “Juventude Transviada”). Após o fim desse casamento e de outro, causou certo escândalo ao unir-se a Anthony Ray, filho de Nicholas e seu enteado. Independente de sua vida pessoal, Gloria é elemento essencial para o clima de luxúria que se instala em “Desejo Humano”, não obstante os limites impostos pelos códigos de moral que vigoravam em Hollywood
Os outros dois filmes do volume 2 foram realizados e lançados em 1956 com um intervalo de poucos meses. Ambos são produções de Bert E. Friedlob, que morreu naquele ano, aos 49. “No Silêncio de uma Cidade” (“While the City Sleeps”) é o melhor, e o menos envelhecido do pacote. Com roteiro de Casey Robinson, adaptado de uma novela de Charles Einstein, tem como ponto de partida um assassino de mulheres jovens e belas, que está assustando a metrópole. Sua atividade movimenta elementos de um jornal que também investigam o crime.
A intriga possibilita situações de luxúria, adultério, perfídias e competição, elementos frequentes na obra de Lang. Daí este ser um de seus longas preferidos, um dos mais honestos que fez, nas suas palavras. Desde o início, o espectador sabe quem é o assassino, o jovem entregador Robert Manners (John Barrymoore Jr., filho dos lendários John Barrymore e Dolores Costello, e pai de Drew Barrymoore). Em vez de ser apenas uma trama investigativa, o habilidoso roteiro mescla vários outros conflitos, mostrando certa atualidade na força do QI (quem indica) junto às redações dos meios de comunicação. O vasto elenco também ajuda muito.
Isso não acontece em “Suplício de uma Alma” (“Beyond a Reasonable Doubt”), que tem roteiro e história de Douglas Morrow, refilmado em 2009 por Peter Hyams em “Acima de Qualquer Suspeita”, com Michael Douglas. Prestigiado pelo Oscar que ganhou em 1949 com o argumento de “Sangue de Campeão”, Morrow escreveu uma trama extremamente original para a época. Gira em torno de um escritor (Dana Andrews) conhecido por ser contra a pena de morte. Para defender suas ideias, aproveita um crime verdadeiro e forja provas contra ele mesmo, visando demonstrar que a Justiça falha. Seu plano conta com o testemunho e registros de um editor (Sidney Blackmer), pai de sua noiva Susan (Joan Fontaine), que será acionado na ocasião da sentença condenatória. Mas um acidente mata o único que pode provar sua inocência. O filme prende a atenção, tem aquele clima sombrio típico na obra do criador de “Metropolis”, porém carece de convicção em muitos momentos.
Desapontado e com a alma em suplício (trocadilho infame), Fritz Lang encerrou a sua atividade nos Estados Unidos, voltando para a Alemanha. Mais velho, voltou à Califórnia onde morreu. Mas, jamais voltou a dirigir naquele território. De qualquer maneira, a sua passagem por Hollywood possibilitou filmes marcantes, hoje clássicos, conforme demonstram esses dois volumes desta auspiciosa coleção.
Alfredo Sternheim é cineasta, jornalista e escritor
Desejo Humano (“Human Desire - EUA - 1954 - 91’) Direção: Fritz Lang Com: Glenn Ford, Gloria Grahame, Broderick Crawford, Edgar Buchanan, Kathleen Case, Peggy Maley, Grandon Rhodes e Diane DeLaire, entre outros.  
DVD: Menu interativo - Seleção de cenas Tela: Fullscreen (1.85.1) Áudio: Dolby Digital (2.0) Idioma: inglês Legenda: português Extras: Trailer Original - Biografia de Fritz Lang (texto)
No Silêncio de Uma Cidade (“While  the City Sleeps - EUA - 1956 - 91’) Direção: Fritz Lang Com: Dana Andrews, Rhonda Fleminbg, George Sanders, Ida Lupino, Thomas Mitchell, Howard DuffVincent Price, Sally Forrest, John Barrymore Jr., Mae Marsh e James Craig, entre outros.
DVD: Menu interativo - Seleção de cenas Tela: Fullscreen (2.11.1) Áudio: Dolby Digital (2.0) Idioma: inglês Legenda: português Extras: Trailers - Biografia de Fritz Lang  (texto)
Suplício de uma Alma (“Beyond a Reasonable  Doubt – Estados Unidos - 1956 - 80’) Direção: Fritz Lang Com: Dana Andrews, Joan Fontaine, Sidney Blackmer, Arthur Franz, Barbara Nichols, Philip Borneuf, Edward Binns, Robin Raymond, entre outros.
DVD: Menu interativo - Seleção de cenas Tela: Fullscreen (2.11) Áudio: Dolby Digital (2.0) Idioma: inglês  Legenda: português Extras: Trailers - Biografia de Fritz Lang  (texto)
Distribuição: Versátil Home Vídeo

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