“Na Estrada”
Uma bela jornada épica de um amor jamais
concretizado.
C&N
Em 1957, Jack Kerouac lançou On The
Road
(traduzido no Brasil como Pé na Estrada), seu livro de caráter
autobiográfico. Com foco na geração Beat, tornou-se um marco
para
a juventude dos anos 1960, que fez de tudo para se libertar do
conservadorismo, do conformismo. A história permaneceu por
muito
tempo influenciando novas gerações. Coube ao diretor brasileiro Walter
Salles
(Central do Brasil, Diários de Motocicleta) mexer num
vespeiro, com a coragem que nenhum outro diretor teve de adaptar
Keroauc para o cinema do novo milênio. E ele se sai bem.
Embora o
filme apresente erros corriqueiros de adaptações
literárias.
Dificilmente o
Na Estrada (On The Road, 2012) de Walter
Salles
chegaria perto da importância do livro, então o diretor limitou-se a prestar
um
tributo às palavras de Kerouac e aos leitores que encararam a
obra
nos anos seguintes ao seu lançamento. Uma opção que transmite o clima
de
rebeldia e liberdade da época, mas que tem seus
significados
diluídos por se concentrar demais no que seus protagonistas sentem
realmente
um pelo outro.
Começa pela
decisão
do roteiro de Jose Rivera em adaptar a fala do escritor Sal
Paradise (Sam Riley), que nos situa no período em que
conheceu o
amigo cowboy tresloucado Dean Moriarty (Garrett
Hedlund): “Eu conheci Dean logo depois da morte do meu pai”. No
livro, os dois se encontraram após o fim do casamento de Sam. Mas
Salles
e Rivera fazem isso para justificar de forma menos complexa a
admiração e a forte amizade entre os dois. Afinal, Dean também
não
tem pai. Por isso não aceita ser adulto e cheio de compromissos.
Feito hoje, o
filme
teria a chance de ser polêmico se não deixasse o teor político da época de
fora
– de preferência que o atualizasse. Mas a essência da adaptação de
Walter Salles é mesmo essa amizade que, na verdade, é um
amor
não consumado. A consequência é um filme mais fácil para uma
geração
que se recusa a ver cinema como arte (nem nos casos mais
gritantes), mas como estilo, que precisa ser renovado de tempos em
tempos. É menos épico, espiritual e provocante, por exemplo, que
outro
filme de mochileiro, cuja origem veio muitos anos depois de Kerouac:
Na
Natureza Selvagem, de Sean Penn. Sem falar no clássico Sem
Destino, muito mais poderoso, e que tinha uma ligação com sua
época,
que vivia a Guerra do Vietnã. Como cinema são mais provocantes no sentido de
nos
fazer pensar no equilíbrio entre ser sossegado na vida e deixar fluir o
espírito
de aventureiro.
No
livro, Sal e
Dean podiam ser confundidos como transgressores que
geravam
um levante à contracultura. Mas Salles reduz a grandeza da obra e a
complexidade da trama numa proposta já antiquada de amor proibido em tempos
de
produções consagradas como O Segredo de Brokeback Mountain.
Ou
seja, Na Estrada, o filme, já nasce velho. Pena. Até porque
o
jovem de hoje não sabe qual luta priorizar. Talvez seja melhor bater na
mesma
tecla e centrar numa discussão atual e relevante, que é de fato
importante.
Como o direito e o respeito de cada um às diferenças e
às
escolhas dos outros. Mas On The Road é muito mais do
que
isso.
Salles é tão
deslumbrado pela obra que não se importa em ser econômico. Algumas partes
não
precisavam ter saído da sala de edição, como toda a sequência envolvendo a
atriz
Alice Braga. Um deslumbramento que chega ao ponto de realizar o sonho
de
Dean e Sal, numa montagem frenética insinuando o
sexo que nunca concretizaram. O diretor também explica demais
o
que era para ser implícito. Como na cena do ménage à trois,
deixando
claro que Sal não quer a fogosa Marylou
(Kristen
Stewart), mas Dean. Outro exagero na explicação de Salles
é o
recurso da narração em off. Parece que estamos lendo o livro. E se
a
proposta serve para justificar a conclusão do filme, que
remete a
um processo de metalinguagem, já vimos uma narrativa cinematográfica
muito mais eficiente e surpreendente neste caso, como em
Adaptação, de Spike Jonze.
Ainda assim,
Salles e Rivera contam uma bela jornada épica de um amor
jamais
concretizado. E propõem um bom estudo de personagens. Principalmente
o de
Dean Moriarty. Devido ao desaparecimento do pai, ele gasta sua
energia (ou raiva?) em sexo casual com mulheres. Mas a única transa que
parece
expor o verdadeiro Dean é com um velho tarado, que lhe paga
por
sexo. Seria um ato inconsciente para punir o pai? Tanto que minutos depois
dessa
cena, Dean parte (sem rumo como sempre) em busca
dele.
Mas esse estudo
é
engrandecido pela surpreendente performance de dois atores. Ponto
para
Kristen Stewart, que está bem. Nunca pensei que diria isso, mas é
verdade. No mínimo, uma atriz muito corajosa. Mas o filme pertence a
Garrett Hedlund. O protagonista de Tron – O Legado se
revela um ator bastante promissor. Chama a câmera para si com total
confiança e rouba todas as cenas. Ei, Oscar, não deixe de pensar
em
Dean Moriarty. Pense em Dean Moriarty. Veja o trailer aqui
Na
Estrada
Na Estrada
(On the
Road -
França/Reino
Unido/EUA/Brasil - 2012 - 137’) Direção: Walter Salles
Com: Kristen Stewart, Amy
Adams, Kirsten Dunst, Viggo Mortensen,
Garrett Hedlund, Sam Riley, Steve Buscemi,
Elisabeth Moss, Terrence Howard e Alice
Braga, entre outros.
Distribuição: PlayArte Pictures
Acesse: www.hollywoodiano.com.
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