‘‘A Estalagem Vermelha”
Filme francês com trama
macabra possibilita rever o comediante Fernandel.
C&N
O
Tempo
é também forte aliado para o esquecimento de pessoas e ídolos, de um passado
não
longínquo. Já não pensava mais em Fernandel (1903 -1971), um dos
comediantes do cinema europeu, entre 1930 e 1960, que obteve
maior
popularidade mundial. Nos meus tempos de infância e juventude, enfrentava
filas
nos cinemas que exibiam os longas da série Don Camilo. Foram
cerca
de cinco, de 1952 até 1965. Em todos, o padre que ele
interpretava, enfrentava confusões no antagonismo com um prefeito comunista,
o
rude Peppone, vivido pelo italiano Gino Cervi.
Depois de
décadas,
revejo o francês Fernand Joseph Desiré Contandin (o nome verdadeiro
de
Fernandel) em “A Estalagem
Vermelha” (“L´Auberge Rouge”), filme de 1951, que me
era
desconhecido. Nele, o ator é um monge da igreja católica,
Christian. Curiosamente, foi o seu trabalho anterior ao
primeiro
“Don Camilo”, feito no
ano
seguinte. Extraída de um conto de Honoré de Balzac (1799-1850), cuja
obra
já serviu de base para mais de 160 filmes, a história passa-se toda em uma
estalagem e seus arredores. As primeiras cenas deixam claro que os eventuais
hóspedes arriscam-se a perder suas vidas, em função dos roubos feitos pelo
casal
proprietário e por um auxiliar. É lá onde vão parar os passageiros de uma
diligência, em meio de uma forte nevasca. A mesma intempérie faz com que
Christian e o seu auxiliar se abriguem lá. Curiosamente, a
senhora Martin (Françoise Rosay), esposa do proprietário,
resolve
se confessar. E relata seus crimes. O padre teme que ela faça o mesmo com os
atuais hóspedes, mas não pode violar o segredo de confissão para salvá-los.
O dilema do monge é o mesmo que
atormenta o padre Logan (Montgomery Clift) em “A Tortura do Silêncio”. Só
que,
em vez do drama daquela criação extraordinária que Alfred Hitchcock
fez
em 1953, a tensão aqui é encaminhada para um humor macabro, onde
Fernandel tem a chance de se movimentar com aquela peculiar expressão
algo equina de candura e perplexidade, que sustentaram a sua carreira e que
ganham realce quando o monge se vê diante do inusitado final. Sem pontuações
moralistas, esse epílogo é arrojado, para a ocasião em que o longa foi
feito.
Tanto no enredo do filme de Hitchcock como neste, há uma evidente má fé
daqueles
que, mesmo sob o poder místico da igreja católica, não hesitam em fazer uso
malandro de uma de suas regras: o segredo da confissão.
Em preto e
branco, a
produção gaulesa envelheceu na evidência da cenografia e na atuação teatral
da
maior parte do elenco. Mas há bons achados no roteiro, escrito pela dupla
Jean Aurenche e Pierre Bost, com a colaboração do diretor
Claude Autant-Lara (1901-2000), refilmado em 2007 por Gérard
Krawczyk. Caso daquele boneco de neve. E a narrativa é bem servida por
uma
balada descritiva, cantada pela voz severa e bela do então jovem Yves
Montand, antes de se tornar também famoso como ator. Por isso, “A Estalagem Vermelha”
envolve
com o seu humor macabro e com a fluente direção do profícuo
Autant-Lara, um artesão refinado que caiu no esquecimento após a
desqualificação do velho cinema francês por parte da turma do Cahiers
Du
Cinema, quando do surgimento da Nouvelle Vague. Não havia
necessidade dessa conduta predatória com o passado. Só que ela se repete de
tempos em tempos. Felizmente, hoje, temos o DVD para nos fazer
voltar ao passado do cinema, avaliá-lo novamente e até mesmo
descobri-lo.
Alfredo
Sternheim é
cineasta,
jornalista e
escritor
“A Estalagem
Vermelha” (“L´Auberge Rouge”- França - 1951 - 98’) Direção:
Claude Autant-Lara Com: Fernandel, Françoise Rosay, Jean-Roger Caussimon, Maire-Claire Olivia, Nane Germon, Didier D´Yd, Jacques Charon, Gregoire Aslan, Robert Berri,
entre outros.
DVD:
Menu interativo - Seleção de cenas Tela:
Cheia Áudio:
(2.0) Idioma:
Francês Legenda:
português, inglês e
espanhol Extras:
Fotos do Filme - Trailers
Distribuição: Cult Classic
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