15 de agosto de 2012

‘‘Duas vezes Shakespeare”


‘‘Duas vezes Shakespeare
Além de peças do autor, À Sombra das Pirâmides e Coriolano têm em comum, atores consagrados estreando como diretores cinematográficos.
C&N
Segundo o site IMDb (The Internet Movie Database), desde 1898, a obra de William Shakespeare (1564-1616) já serviu de base para mais de 850 criações feitas para TV e Cinema. O fascínio que suas peças exercem tem levado atores famosos, que já viveram personagens do dramaturgo inglês no palco e nos estúdios, a se lançarem como diretores cinematográficos, usando textos de sua lavra. Foi assim em 1944 com Sir Laurence Olivier (“Henrique V”). Em 1972 e em 2011, Charlton Heston e Ralph Fiennes fizeram o mesmo em “À Sombra das Pirâmides” (“Antony and Cleopatra”) e em “Coriolano” (“Coriolanus”). Como intérpretes, ambos tinham vivência com a obra do autor. Ambos escolheram duas peças sobre o império romano, escritas uma em seguida a outra, em 1607 e 1608. Mas, na transposição para a tela, optaram por caminhões diferentes.
Um dos melhores atores de toda a história da Sétima Arte, Heston soube conciliar como poucos os conflitos íntimos na alma dos grandes guerreiros. Daí ter personificado, com uma grandeza que sempre incluía certa vulnerabilidade, personagens épicos como, por exemplo, o Moisés de “Os Dez Mandamentos”, os protagonistas de “Ben Hur” (que lhe valeu o Oscar de melhor ator de 1959), “El Cid” e “O Senhor da Guerra”, que lhe possibilitou o prêmio Saci, concedido pelo jornal O Estado de S. Paulo, na ocasião em que eu era crítico no jornal. Esse norte-americano falecido em 2008 aos 84 anos, já tinha interpretado o romano Marco Antonio em duas versões da peça “Julio Cesar”, de Shakespeare. Uma em 1950, dirigida por David Bradley, e outra em 1970, sob a orientação de Stuart Burge. Essa familiarização o fez atuar aqui com total espontaneidade, que realça os conflitos íntimos. E tanto ele como boa parte do elenco não se intimida com a natural reverência que sempre existe no cinema e no teatro em relação aos poéticos diálogos de Shakespeare. Heston falhou na escalação de Hildegarde Neil. Algo dura nas reações, ela não tem o carisma exigido pela personalidade sensual de Cleópatra.
À Sombra das Pirâmides” tem uma narrativa em moldes clássicos ou acadêmicos. Na direção, Heston não quis brilhar e com ângulos funcionais, que sempre favorecem o conteúdo e os intérpretes, fez um filme de visual apurado que resultou mais comunicativo do que “Coriolano”. Neste, ao invés da serenidade do longa feito na Espanha em 1972, temos uma linguagem modernosa com câmera tremula ou histérica, em adaptação que transpôs para a época moderna ou intemporal o conflito romano. Carros, bombas, passeatas, noticiários pela TV e outros elementos contemporâneos se fazem presente no desenrolar da movimentada trama em que Coriolanus (Ralph Fiennes), até então venerado pelo povo, enfrenta a ira popular. Nesse clima de lutas sangrentas e desprezo, ele encara a possibilidade de aliar-se a seu tradicional inimigo, o também guerreiro Tullius (Gerard Butler, sempre garboso).
Coriolano” tem um enredo ainda atual no retrato dos meandros políticos. Em certos casuísmos, fatalmente pensamos em nosso Brasil de tão pouca ética. Mas a modernidade do texto fica prejudicada na maior parte do tempo por essa linguagem excessivamente fragmentada, que cansa o espectador e o afasta do contexto. E isso apesar do ótimo elenco, onde se destaca Brian Cox (o senador Melenius). Fiennes na direção, só se mostra mais coibido quando registra o desempenho de Vanessa Redgrave. Nessas cenas, parece que ele se controla nos maneirismos da câmera; afinal, a grande atriz transmite com poucos recursos e impressionante força interior a determinação e capacidade de manipulação de Volumnia, mãe de Coriolano. A sua presença neste trabalho laureado pelo British Independent Film Awards, se impõe naturalmente. É sempre gratificante ver grandes intérpretes como Vanessa e Charlton Heston a serviço dos belos textos de William Shakespeare. Pena que, às vezes, essa missão fica prejudicada por atitudes pretensiosas.
Alfredo Sternheim é cineasta, jornalista e escritor
À Sombra das Pirâmides (Anhony and Cleopatra - EUA / Espanha / Suíça - 1972 - 144’) Direção: Charlton Heston Com: Charlton Heston, Hildegarde Neil, Eric Porter, John Castle, Fernando Rey, Carmen Sevilha, Juan Luis Galiardo e Freddie Jones, entre outros.
DVD: Menu interativo - Seleção de cenas Tela: Formato Original 16:9 Áudio: Dolby Digital 2.0 Idioma: inglês Legenda: português, inglês e francês Extras: Making Of com Fraser Heston (sem legendas) / Fotos do Filme / Trailers
Distribuição: Cult Classic
Coriolano (Coriolanus - Inglaterra - 2011 - 123’) Direção: Ralph Fiennes Com: Ralph Fiennes, Gerard Butler, Brian Cox, Vanessa Redgrave, Jessica Chastian, Lubna Azabal, Asharf  Barhon, John Kani, Paul Jesson, James Nesbitt e Dan Tana, entre outros.
DVD: Menu interativo - Seleção de cenas Tela: Widescreen Anamórfico Áudio: Dolby Digital (5.1, 2.0) Idioma: inglês e português Legenda: português Extras: Bastidores / Trailers 
Distribuição: Califórnia Filmes

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