‘Muito... muito antes do arco-íris’.
C&N
A
produção acabou ficando mais do que
um
ano em cartaz em Nova Iorque e Brooklin, e viajou durante seis
anos pelos Estados Unidos. No entanto, seu score veio de tantas fontes
diferentes
que nenhuma editora conseguiu juntá-lo numa coletânea para piano e voz e,
apesar
de sua popularidade, “The Wizard of Oz”
nunca
pode ser remontado - houve uma tentativa de remontagem em 2010 pela Cantom Comic Opera Co., no
Canadá - e todos os seus truques e segredos estão perdidos até
hoje.
Quem estava no comando da produção não era Baum, que também compôs as letras,
e
muito menos Paul Tietjens seu
compositor, mas sim Julian
Mitchell
(o mais prolífico diretor de musicais da Broadway de todos os
tempos),
que reescreveu o libreto, dirigiu e coreografou a produção, além de Fred Stone & Dave Montgomery.
Montgomery
&
Stone
(veja aqui e aqui fotos deles
caracterizados) foram dois dos mais amados artistas norte-americanos. Eles
eram
acrobatas talentosos que podiam cantar, dançar, atuar, fazer mímica e
conquistaram a sua fama justamente nesta montagem de “The
Wizard of Oz”, com Montgomery
protagonizando o Homem de
Lata e Stone o Espantalho. Eles se
conheceram
nos seus 20 anos e, em 1894, criaram um número de música e
dança,
usando a cara pintada de preto, que faria o circuito do
vaudeville
nos próximos dez anos. Eles alcançaram seu auge no prestigioso Keith Circuit, antes
de
estrearem na Broadway com “The Girl From Up There”, em
1901. Foram o exemplo clássico daqueles atores que vieram do
vaudeville
para o grande sucesso na Broadway, fama garantida em shows feitos sob
medida para seus talentos. Se na vida real eram bem apessoados e tinham uma
vida
comum, nos palcos eles se tornavam o mais estranhos e excêntricos possível.
Após o grande sucesso de “The Wizard of Oz”, o mesmo time
de
produtores e diretor surgiria com uma imitação, só que tendo como
compositores
os grandes Victor Herbert-Glenn
MacDonough, assim nascendo “Babes in Toyland”, um clássico
dos
primórdios da Broadway, depois filmado com o Gordo e o Magro (“Era Uma Vez
Dois
Valentes”,1934).
Finalmente, um
século depois de sua estreia, o magistral CD “The Wizard of
Oz”
(1903 Vários Compositores)
Studio Recordings, Piano Rolls, Music Box
Discs,
1902-08 (Hungry Tiger
Press,
2 CDs) reconstituiu o show numa antologia. Todos os créditos são devidos ao
produtor David Maxine, para quem
este projeto difícil e assustador foi obviamente um trabalho de amor, já que
não
houve gravação com o elenco original, as partituras que sobreviveram são
fragmentos, e nunca houve uma coletânea completa das músicas e libreto do
show
publicadas. Originalmente, como já dissemos, Baum trabalhou no libreto e letras,
e
Paul Tietjens compôs algumas das
músicas do show, mas esses esforços pararam logo, e deram lugar a uma
quantidade
interminável de canções intercaladas (o nome A. Baldwin Sloane, frequentemente
citado como compositor do show, não está nem em evidência aqui). Como Maxine explica claramente no
encarte do
CD, “The Wizard of Oz” era
atualizado dependendo do artista; assim sendo, o material no musical era
acrescentado e removido incessantemente. Dentre os números mais populares
estavam ‘Sammy’, ‘Hurrah for Baffin’s Bay’e a animadamente sádica ‘Football’. Se estes títulos não parecem
ser
os mais prováveis para se encontrar no caminho para Oz, a sinopse do show,
encontrada em
jornais da época, indica o quão pouco do livro de Baum remanesceu; até mesmo o Leão Covarde teve seu status
reduzido a uma pequena participação. Os dois CDs vêm
abarrotados
com tudo que é tipo de curiosidades. A maior parte deles são gravações
acústicas
das canções, mas alguns números só existem ou em rolos de piano ou em
caixinhas
de música. Também incluídas estão algumas canções que não são de Oz, mas gravadas por membros do
elenco original. É óbvio que o resultado final é uma colcha de retalhos, mas
ajuda muito as letras virem impressas no encarte.
Esta primeira montagem de “The Wizard of Oz” sem
dúvida contribuiu para transformá-lo em um dos grandes mitos
norte-americanos,
antes de ser totalmente solidificado no inconsciente coletivo ocidental, o
que
viria só com o filme de 1939, da MGM, e suas reprises
anuais. Nesta versão da história, o Leão nunca é descrito como
covarde, nunca se torna amigo de Dorothy, e não pode falar. A
Bruxa Malvada do
Oeste
nunca aparece e por isso não pode ser derretida. Não há sapatinho, rubi ou
prata, e a viagem de Dorothy
para encontrar seu caminho de casa é muitas vezes eclipsada por uma história
sobre uma rebelião política na Terra
de Oz. Apesar de ter sido escrito pelo criador de Oz, o enredo simplesmente
não se
parece muito com Oz.
Ainda
assim, o sucesso desta adaptação teatral parece ter sido, pelo menos
parcialmente, responsável por empurrar Oz além de suas raízes, como
um
charmoso conto de fadas da virada do século, e transformá-lo no mito
cultural e
comercial da indústria de entretenimento que é hoje. Na introdução do segundo livro de Oz - “The
Marvelous Land of Oz”
(“A
Maravilhosa Terra de Oz”) -, publicado um ano após este musical ter
estreado
em Nova Iorque, Baum
escreve
que ele prometeu a uma menininha que pediu por uma sequência que, quando
‘milhares de meninas tiverem escrito
(...) mil cartinhas pedindo outra
história’, ele
atenderia o
seu pedido. Baum observa que
‘o sucesso da produção para o palco
[...] trouxe novos amigos para a
história’ e inspirou as
necessárias ‘milhares de cartas’. Baum escreveu mais doze sequências,
uma
coletânea de contos, e tiras de história em quadrinhos sobre de Oz, além de ter produzido
três
filmes mudos usando seus personagens. Ao construir uma marca em Oz, Baum transformou sua história em
uma
propriedade comercial segura, com um valor que deu à MGM a
confiança de investir o dinheiro necessário para fazer o filme que levou
muitos
de nós para ‘além do arco-íris’.
Cláudio Erlichman
é
publicitário
e produtor
cultural.
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