19 de julho de 2012

“O Espetacular Homem-Aranha”


O Espetacular Homem-Aranha

Se Marc Webb não traz nada de novo, ele certamente honra os quadrinhos.
C&N
A decisão da Sony em recomeçar a franquia do Homem-Aranha sem o diretor Sam Raimi e o ator Tobey Maguire gerou uma discussão intensa. Isso foi certo ou errado? Cedo demais ou mais do que na hora? Discussão esta que não foi levantada à toa, afinal o reboot, que também é um remake, surgiu apenas cinco anos depois do último filme da série. E uma década após o primeiro Homem-Aranha. De fato, um intervalo bem curto. Mas a pergunta deveria ser: “Qual é a hora certa para se fazer um remake ou um reboot?
Enquanto sabemos a resposta para a pergunta e, mesmo assim, não fazemos nada para mudar essa tendência hollywoodiana, O Espetacular Homem-Aranha (The Amazing Spider-Man, 2012) precisa ser analisado pelo filme que é. Embora seja difícil (e muito) não compará-lo ao longa de 2002. Pelo menos em sua primeira metade, focada na transformação do jovem, pobre e órfão Peter Parker no super-herói que amamos.
Marc Webb, que fez do indie 500 Dias Com Ela, uma das melhores comédias românticas da década passada, foi chamado para reiniciar a série. Não por ser um grande entendedor do personagem e suas aventuras. Mas – vejam só a cabeça do estúdio – pela história de amor contada em seu filme anterior. Por se concentrar no lado humano, algo que muitas vezes fica em segundo ou terceiro plano em filmes do “gênero”. Isso não quer dizer que precisamos ver o caminho inverso, com Sam Raimi dirigindo um filme como 500 Dias Com Ela. Ok, Hollywood?
Bom, aos poucos, Andrew Garfield, como o novo Peter Parker, vai tomando conta da tela. Ainda tímido, com dificuldade pra falar com mulheres – como conhecemos o personagem dos quadrinhos. Sua atuação é soberba para este tipo de filme. Com a câmera de Webb bem perto de seu rosto e suas ações, Garfield faz a plateia esquecer Tobey Maguire em poucos minutos. O que não quer dizer que ele seja melhor, mas o ex-Homem-Aranha não faz falta. É fácil se reconhecer em seu Peter Parker, pronto para descobrir quem é (e o que é) num mundo acelerado, em constantes mudanças, lotado de pessoas eternamente em conflito, competindo umas com as outras. Todo adolescente enfrentou (ou enfrentará) uma pressão dessas. Com Webb concentrado nas relações humanas, a grande diferença de Parker para a sua entrada forçada no mundo adulto não é a picada da aranha, mas a morte de seu Tio Ben (Martin Sheen) e o dia a dia com a nova namorada, Gwen Stacy (Emma Stone).
O problema é que o filme de Sam Raimi também era assim, embora chegue a esse ponto da história de forma mais rápida e precisa. Raimi se abraçou mais à fantasia, mas nunca abdicou da humanidade de Peter Parker, como um jovem comum arremessado num universo extraordinário sem mais nem menos. Marc Webb se esforça para trazer um pouco de realismo à história que já conhecemos, e enrola mais pra chegar até o momento em que Parker veste o uniforme vermelho e azul. E essa vontade de contar a saga de um super-herói num cenário urbano e real funciona até a hora em que o vilão Lagarto surge na tela, dando um baque e tanto nos olhos da plateia; uma contradição violenta, com a fantasia tomando de assalto a realidade, algo que atrapalha o filme por alguns minutos.
Mas Marc Webb retoma a direção se agarrando à química entre Andrew Garfield e Emma Stone, que é o grande trunfo de O Espetacular Homem-Aranha, deixando o casal Tobey Maguire/Kirsten Dunst no chinelo. Você vai se pegar torcendo por eles.
O diretor também se sai bem nas cenas de ação, embora filme todas elas à noite para disfarçar qualquer “defeito especial” (com exceção de uma luta no interior da escola), e não entregue nada tão empolgante quanto a sequência do trem (rodada durante o dia) em Homem-Aranha 2, ainda o melhor de todos.
O novo filme ainda dá uma atenção exagerada a um mistério envolvendo os pais de Peter Parker. Uma abordagem que parece ser inicialmente equivocada. Até porque no decorrer da trama, ela é esquecida, sendo lembrada somente numa cena surpresa nos créditos finais. Será que precisava disso tudo para explicar o que Parker sente por ser órfão? Precisava tocar no assunto se a trama será desenvolvida somente num próximo filme? O roteiro também apronta uma coincidência de novela das oito aqui e ali para justificar as ligações entre os personagens principais, mas, no fim, o resultado é positivo.
O fato é que Homem-Aranha 1 e 2, de Sam Raimi, foram feitos numa época em que Hollywood via as adaptações de HQs com outros olhos. O clima era de total fantasia, porém muito mais adulto que o tom carnavalesco das produções do gênero nos anos 1980 e 90. Mas ainda não tinha os pés no chão dos dias de hoje, como se realmente um super-herói pudesse existir em nosso mundo real. Mas os filmes de Raimi já refletiam uma seriedade incomum por trás das câmeras graças ao sucesso de O Senhor dos Anéis, que fez a indústria entender que um blockbuster pode e deve ser inteligente e, consequentemente, levado a sério. Em 2012, queira ou não, a época é outra. Ainda mais depois do Batman de Christopher Nolan, que chegou ao máximo da realidade. Embora o sucesso de Os Vingadores tenha comprovado que a fantasia exagerada também tem espaço e que não existe regra alguma a ser seguida.
Se Marc Webb não traz nada de novo, ele certamente honra os quadrinhos. Tanto o seu filme de origem quanto o de Webb podem existir sem problemas no mesmo universo. E talvez a saga de O Espetacular Homem-Aranha siga bem o seu caminho numa inevitável sequência, com o público devidamente acostumado com as novas caras e os novos estilos. Até porque o Aracnídeo sempre foi o herói ideal de Hollywood. O sujeito que deixa sua vidinha comum para viver grandes aventuras, um mundo maior, como o herói predestinado a ter papel fundamental na luta do bem contra o mal. Como Matrix e Avatar. E ele ainda é órfão a exemplo de outros heróis improváveis, como Frodo, Harry Potter e Luke Skywalker. Como os protagonistas das sagas de J.K. Rowling e George Lucas, o novo Peter Parker ainda lida com o misterioso passado de seus pais, enquanto tenta encontrar de vez a sua verdadeira identidade. Não é por acaso que ele tire e coloque a máscara rapidamente – e tantas vezes – no filme de Marc Webb.
O Espetacular Homem-Aranha (“The Amazing Spider-Man” - EUA - 2012 - 136’) Direção: The Amazing Spider-Man Com: Andrew Garfield, Emma Stone, Rhys Ifans, Sally Field e Martin Sheen, entre outros. Distribuição: Sony Pictures

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