“Oklahoma!”
‘O musical que deu início
a Era de Ouro da Broadway era ‘Sem pernas, sem piadas, sem chances’’.
C&N
“Oklahoma!” acabou ficando por 5 anos e 9 meses
consecutivos em cartaz, com 2212
representações,
estabelecendo o primeiro grande recorde de longa duração de shows da
Broadway, que só viria a ser batido 15 anos depois, por “My
Fair Lady”, com 2717. O segredo do sucesso do musical - que
foi
chamado originalmente de “Away We Go!” –
foi
ter sido um espetáculo concebido e encenado de forma completamente diversa
de
tudo o que se fazia em termos de musicais na época, além de uma excelente
música, fundida perfeitamente à história, onde cada canção mantém
continuidade à
ação contando o enredo, e a excepcional coreografia de Agnes DeMille, que introduziu o
conceito de balé integrado à história, fazendo parte dela e dando
‘personalidade’ a cada bailarino, muitas vezes com um simples gesto
ou
passo de dança (o famoso balé ‘Sonho
de
Laurey’/ ‘Dream Laurey Dance’, no final do 1º
ato,
entrou para a história, quando os dois personagens são substituídos por dois
bailarinos, numa das coreografias mais criativas jamais apresentadas na
Broadway - veja aqui em
coreografia
de Susan Stroman).
O
show já começa diferente. Após uma
introdução orquestrada, ao invés de um grande número de abertura, com uma
linha
de coro com belas moças simetricamente escolhidas, e com os trajes mais
sumários
permitidos para a época, ao abrir das cortinas a plateia se depara com um
amplo
cenário mostrando uma pradaria, montanhas delineadas ao longe, tudo
iluminado
por um sol dourado e brilhante. Com uma velha senhora batendo manteiga em
primeiro plano, um caubói vem cantando a linda balada ‘Oh, What a Beautiful Mornin’’. (veja vídeo com Hugh Jackman). ‘Meu Deus!’ – diria a audiência – ‘que maneira de começar um
musical!’. ‘Onde estão os dançarinos, a música vibrante,
o
movimento e a alegria característica de todos os shows musicais?’.
Rodgers
&
Hammerstein II estavam lançando as
bases
da nova comédia musical e decididamente parecia que o público não estava
preparado. Foi apenas depois de 20 minutos do espetáculo ter começado, que o
primeiro coro de garotas entrou no palco. Nova decepção. Todas estavam com
vestidos longos, meias grossas, sapatos pesados, exatamente como a moda
rural do
princípio do século XX pedia. Mais espanto da plateia. A situação
desenvolvia-se
no palco de forma tão inusitada que ao final do 1º ato, da primeira
apresentação
em New Haven, o representante de um dos maiores investidores do show
mandou um telegrama ao seu patrão. Este telegrama, que ficou famoso pelo seu
texto e pelo completo erro de avaliação do espetáculo dizia simplesmente:
‘No legs, no jokes, no
chances’ (isto é, ‘Sem pernas, sem piadas, sem
chance’).
“Oklahoma!” tem ação no início do século XX, num território
indígena
norte-americano, então recém-transformado no Estado de Oklahoma, o
46º da Federação Americana. A trama principal conta a simples
história sobre quem conquistará e ficará com a linda mocinha, a bela Laurey (Joan Roberts): o bom moço Curly (Alfred Drake – talvez o mais bem sucedido
leading man dos anos 1940 e
50, tanto em musicais quanto em peças), ou o mau caráter Jud (Howard da Silva)? Laurey escolhe Jud, mas logo descobre que
está
realmente apaixonada por Curly, e com ele se casa. O
casamento se transforma numa gloriosa comemoração da criação do novo
Estado, onde temos o número com a canção título ‘O-K-L-A-H-O-M-A’.
Jud então morre
acidentalmente numa briga com Curly, que é absolvido, e os
noivos partem felizes na carruagem
com
franjas no teto, que se transformou numa das imagens mais marcantes
deste
musical. Há também uma história cômica secundária, sobre outro triângulo
romântico que envolve a garota Ado Annie (Celeste Holm, futura estrela de cinema e vencedora do
Oscar), que é louca por homens, o caubói Will Parker (Lee Dixon) e o mascate Ali Hakim (Joseph Buloff).
Imortalizado em
um
sem número de remontagens mundo afora, só na Broadway foram cinco: em
1951, 1953 (com Florence
Henderson como Laurey e Barbara Cook numa inesquecível Ado Annie), 1969 (Bruce Yarnell interpretando Curly), 1980 (Christine
Andreas fazendo Laurey e Christine Ebersole no papel de Ado Annie numa
direção de William
Hammerstein, filho de Oscar), e 2003 (Patrick Wilson num memorável Curly e Shuler
Hensley - vencedor do Tony por este papel -
encarnando
Jud), foi também o
primeiro
filme realizado em Todd-AO
(ou
seja, precursor do 70mm), em 1955, com direção
de Fred Zinnemann (“A Um Passo da Eternidade”, “Julia”, “O Dia do Chacal”), tendo no elenco
Gordon MacRae (Curly), a estreante e muito jovem
Shirley Jones (Laurey), Rod Steiger (Jud), o excelente dançarino
Gene Nelson (Will Parker), a veterana Charlotte Greenwood (Aunt Eller Murphy) e Gloria
Grahame (Ado Annie), vencendo os Oscars de melhor som e música (de
musical). Com direção do renomado Sir
Trevor Nunn (que também dirigiu os musicais “Cats”, “Les
Misérables” e
“Sunset Boulevard” entre outros) “Oklahoma!”
mereceu
uma premiada remontagem londrina, lançada em 1999 em vídeo e depois
em
DVD, nos revelando o talento do então desconhecido Hugh Jackman (arrasando num Curly com muito gusto e sex appeal). Curiosamente, em sua
recente passagem pelo Brasil, Hugh Jackman anunciou uma futura
refilmagem de “Carousel”, com Anne
Hathaway, outro musical da dupla Rodgers & Hammerstein II (uma
curiosidade: a dupla poderá ser vista, em dezembro próximo, na esperada
versão
para cinema do musical “Les Misèrables”, ele como Jean Valjean e ela
como
Fantine).
Temos muitas
gravações disponíveis em CD. Prefira a do elenco original da Broadway
(Decca - 1943),
quase
completa e considerada um tesouro sendo a primeira gravação de um grande
musical
americano; e a trilha sonora, de
1955 (Capitol / Angel), maravilhosamente gravada em
estéreo e
ainda mais completa que o da Broadway contendo duas overtures, e todas as danças,
inclusive
o balé do sonho.
“Oklahoma!” permanece como impressionante testemunho da
capacidade da
arte do teatro musical norte-americano. Sua estrutura ainda vive em shows
como
“Side Show”
(1997),
“Ragtime”
(1998),
“Parade” (1998) e “The
Light in the Piazza” (2005 – aliás, composta por Adam Guttel, neto de Richard e filho de Mary Rodgers).
Cláudio Erlichman
é
publicitário
e produtor
cultural.
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