14 de maio de 2012

‘O dia em que tive três pais - Parte I’


O dia em que tive três pais - Parte I
O segundo pai, o príncipe e o editor.
C&N
Foi na Flip de 2005. Como de costume, acabei não programando a ida a Paraty. Aquela coisa: vida de balcão, sem final de semana, somada à cuca fresca, resultam numa viagem um tanto improvisada para mim e a Ana Cristina, moça que me atura. Mas quem tem amigos, tem tudo, já dizia a frase feita. 
Algumas semanas antes, havia recebido em Santos o jornalista Zuenir Ventura e sua esposa, a Mary.
Quem leu algum dos livros do Zuenir pôde conhecer o seu saboroso estilo: um jornalismo misturado à memória, que produziu o já clássico “1968 - O ano que não terminou”, Editora Planeta. Mas quem, além de ler a obra, o conheceu de perto, se depara com um gentleman, uma figura rara, divertida e generosa.
E lá fomos eu e Ana para a histórica Paraty, sem nenhuma entrada para nenhuma mesa, mas cheio de amigos: os escritores.
Depois de cumprimentar o ‘brimoMilton Hatoum, e também o vicentino Zé Miguel Wisnik, encontramos acidentalmente Zuenir e Mary. Foi aquela festa. Estávamos lá, como papagaios de pirata, assim como muita gente, sem ingressos, tomando um café e vendo o movimento de senhoras descoladas, com seus penteados cheios de laquê, echarpes e havaianas, num estilo hippie-cult-paratyense, quando mestre Zuenir nos tirou da pasmaceira. Deu um braço para mim e outro para a minha mulher e rumamos como ‘Dona Flor e Seus Dois Maridos’ para a entrada da tenda dos autores, o mais desejado local da Flip.
Furamos a fila e fomos para a entrada lateral, guardada por um segurança com cara de segurança. Vejam vocês. Zuenir exibe seu crachá como se fosse um crucifixo para o vampiro segurança. O dedicado homem perguntou a respeito das credenciais do jovem casal, no que foi interrompido pelo jornalista: Meu filho e minha nora, eles vem comigo!
Entramos abraçados, os três. Uma vez lá dentro, avistamos Mary, que acenou gritando: Venham, venham!
Estava um pouco escuro, o que me tranquilizou. Fui tentando largar do meu segundo pai, estávamos ainda abraçados, eu queria puxar a Ana para o fundo do auditório, bem no canto, sabe? Pois aí a Mary nos barrou e radicalmente, e de maneira firme, nos guiou à área vip, na segunda fileira. Ela falava: Nada de ir pro fundo. Vocês sentam aqui, ó.
Claro que sentamos e quando vi, estavam do meu lado o príncipe João e, logo ali, o editor da Companhia das Letras, Luiz Schwarcz
. Me afundei na cadeira, comovido pela adoção do casal. Estava maravilhado, mas constrangido de ser um penetra que se expôs ao lado de duas figuras de maior destaque do evento: o príncipe recebe os convidados do festival em sua propriedade, e o Luiz Schwarcz é um dos criadores da Flip. Glup!
À mesa estavam dois ótimos ensaistas: Beatriz Sarlo e Roberto Schwarz, que conversavam sobre literatura, os caminhos da cultura e o seu deslocamento no campo das ideias. Falaram sobre Borges, Machado. Ela, argentina. Ele, brazuca.
O Luiz me viu e cumprimentou com alguma surpresa. E o príncipe, eu que o cumprimentei, quase como um tique nervoso.
Encontrei ainda o Luiz algumas vezes, almocei na pousada dos autores, sempre com meu pai e minha mãe, recém-adotados. Já com o príncipe não me encontrei. A recepção real fica para a próxima.
PS: Continua na próxima coluna, na qual apresentarei meu terceiro pai.
 

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