26 de junho de 2012

“Cabin in the Sky”


Cabin in the Sky
Um monumento a Ethel Waters em toda a sua glória. - TV Guide.
C&N

Pode não ter sido um “Porgy & Bess”, mas Cabin in the Sky foi, em 1940, um novo tipo de show da Broadway all-black cast, ou seja, com todo o elenco composto de atores afro-descendentes. Ao contar a batalha entre céu e inferno pela alma de um homem, tem a dignidade de Porgy combinada com aquele jazz das antigas revistas com atores negros. “Cabin in the Sky era uma parábola sobre a vida dos negros no sul dos Estados Unidos com ecos às peças “Liliom de Férenc Molnar (que se tornaria mais tarde o musical Carousel), e “The Green Pastures”, de Marc Connelly, além da lenda de Fausto. Esta fantasia trata da luta entre Lawd’s General (General do Senhor) e Lucifer Jr. pela alma do indolente e desajeitado Little Joe Jackson, que foi ferido fatalmente em uma briga de rua. Por causa das fervorosas preces rezadas por Petunia, a devota esposa de Joe, a ele é concedido seis meses para fazer reparações que o permita entrar no Paraíso. Lucifer Jr. oferece a tentação em forma de Georgia Brown, mas com a ajuda de Petunia, Joe finalmente consegue se espremer através dos Portões Perolados do céu.
O compositor Vernon Duke, o letrista John Latouche, e o diretor-coreógrafo George Balanchine não pouparam esforços para juntar um elenco maravilhoso: Ethel Waters (Petunia), Dooley Wilson (Little Joe Jackson), Katherine Dunham e seus dançarinos, Todd Duncan (Lawd’s General) e Rex Ingran (Lucifer Jr.). O resultado foi um sucesso artístico esmagador. Miss Waters ganhou aclamação retumbante neste seu único musical, onde cantava o showstopper Taking a Chance on Love’. A MGM teve o bom senso de comprar os direitos para as telas e em 1943 lançou o filme “Uma Cabana no Céu”. Somente Waters e Ingram permaneceram, do elenco da Broadway, mas poucos poderão reclamar sobre os novos membros do elenco: Eddie Rochester Anderson (Little Joe Jackson), Lena Horne (Georgia Brown), Louis Armstrong (The Trumpeter), Butterfly McQueen (Lily), e Duke Ellington e sua orquestra. Com o diretor Vincente Minnelli no comando (este foi o primeiro filme creditado como dirigido por ele) o filme ficou muito fiel ao original dos palcos. O CD com o Film Soundtrack  (Rhino-Turner, 1943) é um tesouro, um raro exemplo de um filme onde uma música adicionada é totalmente igual a tudo do score original: a sublime balada ‘Happiness Is Just a Thing Called Joe’ de Harold Arlen & E. Y. Harburg, cantada por Waters, e indicada ao Oscar. Porém a canção mais famosa do musical ficou sendo ‘Stormy Weather’ que, embora tenha se tornado marca registrada de Ethel Waters, é imortalizada no filme por Lena Horne. Muita gente ainda acha que esta música foi composta por Irving Berlin. Em suas memórias Harold Arlem (que compôs a música com letra de Ted Koehler) conta uma divertida passagem onde toma um táxi e o motorista a está assobiando. Arlem pergunta:
Você sabe quem escreveu esta música?
Claro - responde o motoristaIrving Berlin.
Errado, diz Arlen. Mas eu te dou mais duas chances para acertar. Após o motorista supor que foi Richard Rodgers e Cole Porter, Arlen diz:
Não, você errou novamente. Eu escrevi esta música!
Mas quem é você?, perguntou o motorista.
Eu sou Harold Arlen.
O motorista então dirigiu por mais meia quadra, parou, virou-se e perguntou:

Quem?

Como cereja do bolo esta gravação nos dá duas interpretações – ambas cortadas do filme – da elegante e hedonista ‘Ain’t It the Truth’ de Arlen & Harburg: uma é o grande número encabeçado por Armstrong e a outra um suave ronronado por Lena Horne. É justamente este o número em que ela aparecia tomando um banho numa banheira com espumas, e que mais tarde poderia ser visto na coletânea “Era Uma Vez em Hollywood - Parte III (“That’s Entertainment! III” - 1994), onde ela relata que esta cena foi retirada porque para ‘mostrar uma mulher negra cantar em um banho era além dos limites da decência moral em 1943’. Quatorze anos depois deCabin in the Sky, Arlen e Harburg re-usariam Ain't It the Truthpara o musical da Broadway Jamaica onde também foi cantada por Lena Horne.
Cabin in the Sky sempre será lembrado por seu libreto inteligente e espirituoso, que tratava seus personagens e sua etnia com uma dignidade rara em filmes e musicais americanos daquela época, apesar de algumas representações ainda serem um pouco chocantes para a sensibilidade do século 21 (aparentemente, para chegar ao céu depende principalmente de quanto dinheiro você dá para a igreja).
Cláudio Erlichman é publicitário e produtor cultural.

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